A sucessão em Belém, PA - "casamento" e "divórcio" (2ª parte)

No dia 27 de janeiro de 1997, iniciou-se um novo tempo para a Assembleia de Deus (AD) em Belém do Pará. Nesta data, Firmino da Anunciação Gouveia (até então o sétimo pastor da igreja) entregou a liderança da igreja pioneira ao pastor Samuel Câmara. Como visto na postagem anterior (leia aqui), a sucessão revelava que o “casamento” entre Gouveia e Câmara havia dado certo, mas por outro lado, acelerou o processo de “divórcio” entre a Igreja Mãe e a COMIEADEPA.

Porém, desde que o pastor Gouveia anunciou (ou até antes disso) sua jubilação e oficializou o nome do sucessor, houve uma intensa movimentação de bastidores para tentar demovê-lo da decisão. Líderes assembleianos não queriam ver uma igreja de importância histórica ser entregue ao pastor Samuel Câmara.

Aos 40 anos de idade, o acreano Samuel Câmara despontava como uma liderança jovem e de projetos arrojados na evangelização. Num tempo em que os pastores assembleianos ainda debatiam as velhas questões sobre o aparelho de TV, Câmara estava na vanguarda com a formação da Rede Boas Novas (RBN) de rádio e televisão.

Outro fator acendeu o alerta: Samuel conseguiu fazer do seu irmão, o pastor Jônatas Câmara seu sucessor na direção da AD em Manaus e no estado amazonense. Com Jônatas na liderança regional no Amazonas, Samuel teria a parceria garantida para o projeto de mídia. Em 1999, a RBN expandiu suas fronteiras com a aquisição da Vinde TV (canal pago) na cidade do Rio de Janeiro.

MP março de 1997: Câmara assume a AD em Belém, PA

Assim, na posse do pastor Câmara na AD em Belém, apesar do Mensageiro da Paz destacar a superlotação do templo-sede da igreja e pontuar que a igreja belenense era a “mais importante AD no Brasil, sob o ponto de vista da história da denominação”, algumas ausências foram notadas: José Wellington Bezerra da Costa, presidente da CGADB e Gilberto Marques da COMIEADEPA não prestigiaram o evento.

Coube ao mineiro Anselmo Silvestre (1º vice-presidente da Mesa Diretora) dar posse ao novo pastor da AD em Belém. Ronaldo Rodrigues de Souza, diretor executivo da CPAD, representou a editora. Entre os convidados e representantes religiosos, civis e militares na cerimônia, não há nenhuma menção à COMIEADEPA. Ignorada na sucessão, a cúpula da convenção paraense também deu de ombros para a Igreja Mãe.

Nesse período, o novo pastor da Igreja Mãe ainda destacava-se entre os líderes da Convenção Geral. Enquanto ainda estava no Amazonas, Câmara ocupou o cargo de 1º secretário na Mesa Diretora (1995). Depois da posse na AD em Belém, Samuel foi eleito 4º secretário (2001) e 1º vice-presidente (2005). Aliás, o cargo de 1º vice foi disputado numa votação à parte, pois todos os demais cargos da Mesa Diretora foram eleitos por aclamação.

Porém, no âmbito regional, a sina herdada do seu antecessor continuou e a cada eleição para à presidência da COMIEADEPA, o pastor da igreja pioneira do Pará não conseguia fazer valer o peso histórico da instituição e voltar ao comando da convenção regional. O pastor Gilberto Marques, sempre muito bem articulado, conseguiria, em reeleições sucessivas, barrar seu antigo conhecido do IBAD.

E na medida em que as disputas na Convenção Geral aumentavam, na COMIEADEPA o pastor da Igreja Mãe era impedido de se sobressair. E antes que ocorresse mais uma divisão nos quadros da CGADB, a cisão institucional já estava sendo gestada no Pará. O “divórcio” seria inevitável nas terras onde Daniel Berg e Gunnar Vingren implantaram a AD.

Fonte:

ALENCAR, Matriz Pentecostal Brasileira: Assembleias de Deus 1911-2011 (2ª edição ampliada). São Paulo: Recriar; Vitória: Editora Unida, 2019.

ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.

BORGES, Jonas. Firmino Gouveia, um empresário de Deus: sua vida e sua obra. Belém: Semin, 1997.

COSTA. Moab César Carvalho. O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores. São Paulo: Recriar, 2019.

DANIEL, Silas. História da Convenção Geral dos Ministros das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Brasil -1930 a 2021 (Edição Revista e Ampliada). Rio de Janeiro: CPAD, 2022.

FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

MENSAGEIRO DA PAZ, ano LXVII - nº 1320, março de 1997.

SUCESSÃO NA ASSEMBLEIA DE DEUS EM BELÉM DO PARÁ (1997): UMA ANÁLISE DOS ATOS RETÓRICOS - por Saulo Baptista. Disponível

Comentários

  1. Não tinha outro jeito. A AD de Belém não tinha jovens. Predominava na membresia, pessoas da terceira idade.

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