Maria de Lourdes do Agreste

O ministério feminino dentro das Assembleias de Deus (ADs) sempre foi motivo de intensos debates. Seja para defender o legado das pioneiras, e assim legitimar a ordenação de mulheres ao ministério, ou para combatê-lo como se isso fosse a maior das heresias assembleianas, o papel das mulheres na igreja e o seu reconhecimento divide os assembleianos.

Oficialmente, a discussão ficou restrita nas CGADBs de 1930, 1983 e 2001. Em todas essas Convenções Nacionais, a possibilidade de ordenação ou reconhecimento formal do ministério das mulheres foi rejeitada. Porém, no mundo real, a realidade sempre se impôs sobre os “dogmas” eclesiásticos.

Como exemplo disso, deixo na íntegra aos leitores do blog, a matéria da revista A SEARA (edição maio/junho de 1961) onde publicou-se a história da irmã Lurdes (Maria de Lourdes) Alencar, que no ano de 1957, iniciou o trabalho da AD em Ipubi, na época distrito do município de Ouricuri, no sertão pernambucano.


Segundo o colaborador do periódico, o irmão João Calixto de Alencar (provável parente da pioneira), Lurdes, além de iniciar a evangelização da pequena vila e liderar a igreja “com muito bom senso e graça de Deus”, tempos depois “tomou sobre si o empenho de construir um templo” para a congregação que florescia no Agreste de Pernambuco.

Assim, sob a liderança da irmã Alencar, os crentes de Ipubi saíram do provisório casebre onde congregavam para um templo próprio. É informado ainda, que a congregação em Ipubi pertencia ao campo de Bodocó, liderado pelo então presbítero Natanael Beuttenmüller, descrito como “homem humilde, porém cheio de sabedoria”.

A resolução da CGADB de 1930 afirmava que as irmãs teriam “todo o direito de participar na obra evangélica, testificando de Jesus e da sua salvação, e também ensinando quando for necessário”. A irmã Lurdes foi além da determinação, pois ela ensinou, conduziu e edificou uma casa de oração para os fiéis e o seu trabalho não foi invalidado por ser mulher. Deu frutos que até hoje permanecem. A realidade atropelou a teoria.

A "heroína da causa cristã” é lembrada pelos familiares como uma mulher de fibra, mas também opiniosa. Gostava de estar à frente de trabalhos na igreja e de exercer sua influência entre os seus familiares e irmãos na fé. O fato de Antoliano Peixoto de Alencar, seu esposo, ser primo de Miguel Arraes, um importante político pernambucano, pode ter ajudado a consolidar a proeminência da família entre os crentes. Eles faziam questão de evidenciar o parentesco com Arraes.

Essa desenvoltura toda passou pelo menos para um dos filhos: Ariacy de Alencar. Quando Ipubi recebeu sua emancipação política em 1962, Ariacy foi eleito vereador na cidade. Com a mudança da família para Goiânia, GO, Ariacy chegou a conquistar dois mandatos de vereador em Goiânia (1988-1992/1997-2000). Foi também secretário extraordinário da Prefeitura Municipal de Goiânia (1992) e suplente de deputado estadual (1991-1995).

Lurdes também desenvolveu atividades de destaque na AD em Campinas, Goiânia. Com o falecimento do esposo, a matriarca foi cuidada até a morte por uma de suas filhas na cidade do Rio de Janeiro. Descansou das suas obras!

Fontes:

ALENCAR, Matriz Pentecostal Brasileira: Assembleias de Deus 1911-2011 (2ª edição ampliada). São Paulo: Recriar; Vitória: Editora Unida, 2019.

ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.

DANIEL, Silas. História da Convenção Geral dos Ministros das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Brasil -1930 a 2021 (Edição Revista e Ampliada). Rio de Janeiro: CPAD, 2022.

FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

Comentários

  1. Há muitas mulheres Brasil afora desempenhando papeis pastorais e de liderança, não obstante a blindagem oficial.

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    1. Eu diria que há pastoras, que realmente possuem o dom e a vocação para isso, mesmo sendo raramente reconhecidas como tal, e "pastoras", que recebem o "título" apenas por ser casada com um pastor (geralmente presidente; no ministério de Madureira, pelo menos, é assim) e, com raras exceções, exercem a liderança de forma atabalhoada, sem preparo nem freio, produzindo mais galho que fruto.

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    2. Por onde anda suas netas Talita e Tamara? Se me lembro bem, tinha o Tiago também, ambos moraram aqui em Goiânia na casa da Miss Lurdes de Alencar. Bons tempos aqueles...

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  2. Eu a conheci pessoalmente, congregamos juntos na AD Campinas em Goiânia. Uma mulher cheia do Espírito Santo, que conduziu por décadas o círculo de oração na igreja sede. Meu retorno a Jesus, foi em minha casa, quando esta missionária junto com a líder dos adolescentes (tia Tereza) foram a minha casa, e depois de um louvor da Harpa Cristã (hino 15) e oração, fizeram o apelo e eu voltei pro Senhor. Uma família abençoada, seus netos tocaram na orquestra Aliança por muito tempo, mas quando a Missionária ficou doente, voltaram pra Pernambuco e depois perdemos o contato.

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