Jurisdição Eclesiástica - subsídios históricos (1ª parte)
Durante os debates nas Convenções Gerais das Assembleias de Deus (CGADB), um termo ficou consagrado: jurisdição eclesiástica ou “campo”. Segundo o historiador Isael de Araújo, campo “é a área de atuação de um Ministério” ou uma rede de congregações vinculadas a uma “igreja-mãe”.
No desenvolvimento das Assembleias de Deus (ADs), os campos eclesiásticos formaram-se conforme expansão de determinada “igreja-mãe” ou “matriz”. Mas o rápido crescimento das igrejas gerou um dilema para os pioneiros: a “invasão de campo”, ou seja, alguns Ministérios extrapolavam os limites (em geral fronteiras geográficas) do “seu campo” para atuar em áreas onde já existia uma outra AD.
A conhecida rivalidade Missão x Madureira deu-se nesse contexto. Um exemplo típico das polêmicas que atravessaram décadas de debates internos nas ADs foi o caso da cidade de São Paulo. A AD na capital paulista foi implantada em 1927, pelo pioneiro Daniel Berg, mas em 1938, o pastor Paulo Macalão abriu uma congregação ligada ao Ministério de Madureira, no RJ.
Iniciativas como essa causavam mal estar entre as lideranças. Evidência disso foi a proposta do missionário Otto Nelson na CGADB de 1941, em Porto Alegre, para que existisse somente uma igreja em cada cidade “para evitar lutas”. No entender do sueco “uma grande igreja teria maior influência do que muitas pequenas”.
Como a sugestão de Nelson afetava diretamente os interesses de Macalão, este argumentou ser contrário à dominação de uma só igreja, pois haveria o perigo das outras congregações viverem sob uma “organização rígida”. Para o líder carioca, a pluralidade eclesiástica garantiria a liberdade de ação evangelística.
Conforme o crescimento dos Ministérios, principalmente nas regiões metropolitanas, as Convenções Gerais tentavam criar normas para transferências de membros e obreiros com o objetivo de “preservar a unidade” assembleiana. Contudo, na observação do missionário canadense Thomas Hoover “Políticas eclesiásticas proliferavam e o roubo de ovelhas era comum”.
Deve-se lembrar, que todo esse embate ocorreu no contexto de migrações, onde crentes pertencentes a determinado ministério muitas vezes realizavam reuniões domésticas em suas regiões e não “congregavam” na AD local já implantada. O caso de Brasília é um exemplo disso.
O jornalista Jason Tércio conta que nos alojamentos de uma construtora, os trabalhadores crentes realizavam seus cultos num barraco erguido e queriam abrir uma AD não vinculada ao trabalho de Madureira no Distrito Federal. Assim, nem sempre de forma planejada se dava a “invasão de campo”.
Mas como retirar a liberdade de um grupo de crentes iniciar sua própria congregação? A CGADB tentava solucionar essas questões. Na maioria das vezes sem sucesso.
Fontes:
ALENCAR, Matriz Pentecostal Brasileira: Assembleias de Deus 1911-2011 (2ª edição ampliada). São Paulo: Recriar; Vitória: Editora Unida, 2019.
ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.
BORGES, Jonas. Firmino Gouveia, um empresário de Deus: sua vida e sua obra. Belém: Semin, 1997.
CORREA, Marina. Assembleia de Deus: Ministérios, Carisma e Exercício de Poder. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.
COSTA. Moab César Carvalho. O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores. São Paulo: Recriar, 2019
DANIEL, Silas. História da Convenção Geral dos Ministros das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Brasil -1930 a 2021 (Edição Revista e Ampliada). Rio de Janeiro: CPAD, 2022.
FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.
HOOVER, Thomas Reginald. Gustav Bergstrom: herói anônimo. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.
TÉRCIO, Jason. Os Escolhidos - a saga dos evangélicos em Brasília. Brasília: Coronário, 1997.
Uma pena que a disputa sempre foi por poder e não por pessoas carentes de Cristo.
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