Adhemar de Barros e Paulo Macalão: amizade político-pentecostal

Em época de eleições gerais, não são poucas as críticas que muitos evangélicos (tradicionais ou pentecostais) fazem em relação aos seus principais líderes e à demasiada exposição destes em favor de determinados candidatos. Muitos até falam em tom nostálgico: "antigamente não era assim" ou "naquele tempo os pastores não se metiam em política".   

Nesta postagem vamos revisitar um caso muito antigo de uma inusitada "amizade" entre um grande líder pentecostal (Paulo Macalão) com um dos mais controversos políticos brasileiros (Adhemar de Barros). A simbiose entre ambos trouxe ao pastor da AD em Madureira proveitos, mas também muitos ataques movidos pela imprensa carioca da época.

Adhemar de Barros (1901-1969) ficou conhecido por realizar grandes obras públicas como governador de São Paulo e prefeito da capital paulista, o que levava a ser sempre um nome viável para a disputar a presidência da República. Populista e autor da famosa frase "fé em Deus e pé na tábua!", embora se proclamasse católico fervoroso, frequentava terreiros de candomblé, centros espíritas e consultava médiuns antes de tomar decisões administrativas. No período do Estado Novo (1937-1945), recomendou a Getúlio Vargas os trabalhos de um paranormal. 

O saudoso governador nunca escondeu o seu desejo de ser presidente da República e usava os cargos para promover-se. Apoiou Getúlio nas eleições de 1950, mas de olho na sucessão do próprio Vargas, prevista para 1955. Para realizar seus objetivos, a velha raposa política do "rouba, mas faz" não tinha o menor pudor em infiltrar-se no meio pentecostal. A agenda do governador paulista no Rio, em dezembro de 1949, publicada no jornal A Gazeta de Notícias já noticiava a sua visita na AD em Madureira (diga-se de passagem, no período vespertino).

A confluência de interesses entre Adhemar de Barros e Paulo Leivas Macalão parecia vantajosa para ambos. De um lado, um político ávido pelo poder e do outro, um líder pentecostal estruturando seu Ministério, atuando nas mais diversas áreas (evangelística, educacional e social) e buscando formas de projetar ainda mais a AD em Madureira e viabilizar recursos.

MP informando a presença de Adhemar de Barros em Madureira

No Mensageiro da Paz de maio de 1951 revelou claramente a estratégia entre o político paulista e o pastor carioca. Na seção "Na Seara do Senhor" — espaço do periódico destinado a relatar o crescimento das ADs pelo Brasil —, divulgou-se a inauguração das novas instalações da Escola São Paulo mantida pela AD em Madureira com a presença festiva do próprio governador paulista.

Segundo o informativo, "há muito ele [Barros] mantém amizade com a família Macalão" sendo que a "direção do estabelecimento de ensino sentiu a obrigação de convidá-lo para a inauguração do seu retrato numa das salas que recebeu seu nome". Uma homenagem significativa para demonstrar o alinhamento entre os dois líderes. Ainda no mesmo evento, o então governador de São Paulo discursou por alguns minutos e seu vice também elogiou a obra social da AD em Madureira.

O momento histórico era propício para esse tipo de aproximação. Entre 1945 a 1964, os partidos e movimentos sociais se organizaram na disputa por espaço político. Os votos das mais variadas classes e segmentos sociais começaram a ser pleiteados pelos candidatos. Nessa lógica, os pentecostais eram vistos como eleitores em potencial e não podiam ser desprezados. Para Adhemar de Barros, os votos de católicos, espíritas e pentecostais tinham o mesmo valor e era necessário cooptar lideranças dessas ramificações religiosas.

Paulo Macalão foi um precursor no meio das ADs do que acontece hoje: amizades e ligações com pessoas do alto escalão da política, algo benéfico para seus projetos. Parece que nada mudou de lá para cá. Todavia, de olho nessa inusitada relação, a imprensa da época não poupou o líder pentecostal de fortes ataques. Mas isso é assunto para uma nova postagem...

Fontes:

ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.

CORREA, Marina A. O. Santos. Dinastias Assembleianas: sucessões familiares nas igrejas Assembleias de Deus no Brasil. São Paulo: Recriar, 2020.

DANIEL, Silas. História da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.

FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

FRESTON, Paul. Protestantes e Política no Brasil: da Constituinte ao Impeachment. Tese de Doutorado em Ciências Sociais, UNICAMP, 1993.

Comentários

  1. MUITO RELEVANTE PESQUISA: ME FEZ LEMBRAR DO ÚLTIMO CAPÍTULO DO: LIVRO "LIDERANÇAS PROTESTANTES NO BRASIL" DA EDITORA DA UFPE. QUE DISCORRE SOBRE TEMA SEMELHANTE.

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