Firmino, o sétimo - temperamental eu sou

Na simbologia bíblica, sete é o número da perfeição e da plenitude. O pastor Firmino da Anunciação Gouveia foi o sétimo pastor (1968-1997) da AD em Belém e, até o momento, o mais longevo no pastorado. Mas pelo andar da carruagem, seu sucessor, o pastor Samuel Câmara, deverá ultrapassá-lo em breve.

Quando assumiu a AD em Belém, em 1968, a cidade contava com aproximadamente 600 mil habitantes e a igreja possuía 12 filiais. Nesse momento, a metrópole da Amazônia já vivia o impacto da construção da Rodovia Belém-Brasília, que resultou na explosão demográfica vista nas décadas seguintes.

Em 1997, quando Firmino deixou a liderança da igreja, o número de congregações refletia o crescimento expressivo da cidade, que estava na casa dos 1.200 mil habitantes. Em sua biografia constam mais de 154 congregações construídas sob sua gestão. Uma média de cinco templos edificados por ano.

Em praticamente três décadas de pastoreio, Gouveia implantou um instituto bíblico chamado de “Escola de Profetas” entre 1973/74 e investiu em missões, principalmente enviando obreiros para o interior do Piauí. Para dinamizar o trabalho, Firmino propôs a realização de cultos no domingo à noite nas congregações e dividiu o campo em áreas supervisionadas por presbíteros de sua confiança.

Firmino, o sétimo: nos seus tempos de liderança na AD em Belém do Pará

Porém, um dos seus maiores desafios foi a construção do templo-sede em Belém, obra iniciada em 1980, inaugurada em 23 de abril de 1988. Além de ser uma edificação cara em termos humanos e financeiros, é bom recordar que a década de 1980, foi marcada pela crise econômica e hiperinflação, obstáculos que dificultavam qualquer planejamento de recursos e gastos.

A “Era Firmino” também foi marcada pelo seu temperamento forte e embates dentro da denominação. Na CGADB de 1975, realizada em Santo André, SP, na apresentação de relatórios financeiros e outros assuntos relativos à CPAD, o então diretor geral da empresa, o pastor Altomires Sotero comprou uma briga com o pastor em Belém.

Os motivos do embate de Firmino e do presbitério em Belém, supostamente, foram as cobranças de débitos da igreja com a Casa Publicadora. Gouveia “sentiu-se humilhado” pela forma como foram cobradas as dívidas “de modo até certo ponto anticristã”. Por isso, em nota no Mensageiro da Paz, foi informado que o ministério belenense “mesmo com sacrifício, [resolveu] liquidar seu débito com a CPAD”.

Na réplica à nota, a redação da CPAD elogiou o ato da igreja e explicou: Sotero Cunha “jamais pôs em xeque o critério e a sinceridade” do ministério da igreja e do seu presidente. Todavia, a insatisfação do pastor da Igreja-Mãe revelou os bastidores das Convenções Gerais e suas relações tensas com certos líderes.

Outro episódio de grande animosidade foi o da “invasão” de campo por parte do Ministério de Madureira em Goiás em terras paraenses em 1979. As congregações abertas no Pará feriam abertamente acordos pré-estabelecidos nas Convenções Gerais. Depois de apelar aos presidentes da Junta Executiva da CGADB e do Conselho Administrativo da CPAD, e enviar emissários para reclamar providências, sem, contudo, serem atendidos, Firmino em decisão apoiada pelo pastor Luiz de França Moreira (presidente do Serviço de Evangelização dos Rios Tocantins e Araguaia - SETA), resolveu pedir o desligamento da Convenção Geral.

O caso acabou se resolvendo nos bastidores da política eclesiástica e o desligamento nunca veio a público. Mas, o pastor Alcebiades Vasconcelos, antecessor de Gouveia na Igreja-Mãe, escreveu-lhe uma carta* com a seguinte exortação: “... vossa atitude parece-me estranha e não condizente com a história dessa querida igreja de Belém do Pará e do seu ministério”.

Com seu forte temperamento, Firmino sempre foi referência nas ADs. Prova disso foi a CGADB de 1987, realizada em Salvador, BA. Em meio a disputa política entre os Ministérios da Missão e Madureira, o pastor da AD em Belém foi eleito 5º secretário por aclamação. Motivo: ambas as chapas colocaram seu nome para o mesmo cargo.

Firmino, o sétimo tinha seu lado temperamental, nunca foi "perfeito". Porém, era reconhecido como um grande líder no Norte. Entre as décadas de 1980/90, ela ainda enfrentaria mais alguns desafios. Aguarde!

* Cópia da carta está nos anexos do livro “O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores".

Fontes:

ALENCAR, Matriz Pentecostal Brasileira: Assembleias de Deus 1911-2011 (2ª edição ampliada). São Paulo: Recriar; Vitória: Editora Unida, 2019.

ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.

BORGES, Jonas. Firmino Gouveia, um empresário de Deus: sua vida e sua obra. Belém: Semin, 1997.

CORREA, Marina. Assembleia de Deus: Ministérios, Carisma e Exercício de Poder. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

COSTA. Moab César Carvalho. O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores. São Paulo: Recriar, 2019

DANIEL, Silas. História da Convenção Geral dos Ministros das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus no Brasil -1930 a 2021 (Edição Revista e Ampliada). Rio de Janeiro: CPAD, 2022.

FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

Mensageiro da Paz, ano 45, nº 07, 1975.

COSTA, Moab César Carvalho. O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores. São Paulo: Editora Recriar, 2019.

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