Revisitando as Convenções Gerais: 1999 - A CGADB da liminar

"São teus inimigos todos aqueles que se sentem ofendidos pelo fato de ocupares o principado; e também não podes conservar como amigos aqueles que te puseram ali, pois estes não podem ser satisfeitos como pensam." 
Nicolau Maquiavel, O príncipe, capítulo III


Certamente, a CGADB, realizada no Palácio de Convenções do Anhembi, na cidade de São Paulo/SP, entre os dias 11 e 15 de janeiro de 1999, foi a mais polêmica da década que se encerrava. Cyro Mello, colunista do Mensageiro da Paz, chamou-a de "Convenção da liminar", onde os "discursos e assuntos discutidos ficaram 95% só para quem entendessem de leis". As liminares (ordem judicial provisória que analisa um pedido urgente) foram a parte visível e pública das intensas disputas de bastidores pelo controle da CGADB. 

No Anhembi, em 1999, o Pastor José Wellington da Costa disputou novamente a presidência da CGADB com o Pastor Túlio Barros Ferreira, da AD em São Cristóvão/RJ. Na Convenção Geral em Belo Horizonte, em 1997, Wellington havia vencido o pastor Túlio com 65,45% dos votos válidos, mas o movimento de líderes descontentes com os rumos da CGADB voltou à carga naquele conclave. 

Wellington confessou em sua biografia que o Pastor Túlio foi seu "concorrente mais temido". O líder da histórica AD carioca criticava o abandono da igreja na parte doutrinária e a apatia da administração Costa à frente da entidade. O líder do Belenzinho, por sua vez, questionava o legado do pastor Túlio que, segundo ele, em quatro gestões como presidente da CGADB havia deixado somente uma fotografia sua na parede da sede da instituição. 

Meses antes da convenção, o pastor Túlio Barros distribuiu entre os ministros presentes em São Paulo um panfleto crítico à Mesa Diretora da Convenção. O impresso recebeu o sugestivo título de "Mudança de rumo" e era direcionado "aos pastores das Assembleias de Deus no Brasil, cuja visão está acima de qualquer interesse pessoal...". 

Em seus "considerandos", o libelo alertava que a CGADB, "há algum tempo", estava operando "fora dos seus propósitos" e que a instituição deveria "atender aos interesses comuns da Igreja, sem que isso se tornasse um meio de promoção pessoal ou de interesse grupais ou mesmo o uso de nepotismo contrário aos ensinamentos bíblicos". 

José Wellington e Túlio Barros na CGADB da liminar

Os demais parágrafos refletiam os ânimos de muitos caciques da CGADB: falta de oportunidades e participação na Mesa Diretora e seus órgãos "tomados em rodízio constante, por longos anos, por grupos de interesse". O documento revelava a insatisfação das lideranças mais expressivas das ADs, que se sentiam alijados pelo status quo. 

Em suas últimas linhas no livrete, conclamava-se os convencionais a reivindicar "os princípios históricos de uma Convenção democrática, sem que novamente caíssemos nas mãos de um governo autocrático e caudilhístico". As palavras eram fortes e reveladoras do clima de bastidores da Convenção Geral daquele ano. 

Líderes expressivos endossavam o manifesto: João Alves Corrêa, Paulo Alves Corrêa, José Ezequiel da Silva, José Clarimundo César, Israel Pimenta, Uriel de Jesus, Samuel e Jonatas Câmara, Delfino Brunelli, Josias de Almeida Silva, Horácio da Silva Júnior, Alfredo Reikdal, Eliseu Menezes entre outros. O pastor João Alves Corrêa, inclusive, tinha presidido a CGADB por três vezes. Como se percebe, era uma oposição considerável ao pastor José Wellington. 

Porém, os planos da oposição foram abaixo, quando do lado do grupo "Mudança de rumo" começaram a aparecer liminares contra a Mesa Diretora, antes da nova eleição. Nunca, até aquela CGADB, as questões internas da instituição haviam parado nos tribunais da justiça secular. Fato que o pastor Wellington soube explorar entre os convencionais presentes no Anhembi. Tal situação de perplexidade gerada entre os ministros por causa das liminares permitiu que a reeleição do pastor José Wellington da Costa fosse absoluta e ele conquistasse 71% dos votos válidos. 

A animosidade ficou flagrante quando o vencedor, o Pastor Costa, fez os protocolares agradecimentos a todos os participantes da eleição, afirmando que ele e o pastor Túlio não eram adversários, mas irmãos em Cristo, sendo assim, "a amizade e comunhão" permaneceriam após a eleição. A relação fraterna pode até ter continuado, mas o fato é que Túlio Barros Ferreira se desligou não muito tempo depois da convenção que liderou por quatro vezes. 


Fontes:

ARAÚJO, Isael. José Wellington – Biografia. Rio de Janeiro: CPAD, 2012.

ARAÚJO, Isael de. Dicionário do Movimento Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.

DANIEL, Silas. História da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.

FAJARDO, Maxwell. Onde a luta se travar: uma história das Assembleias de Deus no Brasil. 2 ed. São Paulo: Recriar, 2019.

Mensageiro da Paz, fevereiro de 1999, ano LXIX, nº 1343, Rio de Janeiro: CPAD

Comentários

  1. Fico a indagar, será se o saudoso Pastor Túlio Barros vencesse, São Cristóvão estaria do jeito que está hoje??
    Saudades desta antiga igreja que saiu do rumo de uma assembléia de Deus

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  2. Só lembrando que Túlio aderiu a tal visão apostólica, virou apóstolo e sua igreja hoje é uma igreja tipica neo pentecostal...

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  3. E o patrimonio material e economico da Assembleia de Deus em São Cristovao devia ser devolvido aos membros de origem

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  4. Embora a igreja pastoreada pelo nobilíssimo pastor Túlio Barros Ferreira seja chamada de "AD de São Cristóvão", eu gostaria de saber se ele filiado a alguma convenção e qual seria o nome dela ("Convenção de Ministros das Assembleias de Deus do Rio de Janeiro", "Convenção das Assembleias de Deus do Estado do Rio de Janeiro...").

    Quem souber, por favor, me responda.

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  5. Alguém sabe como era o nome da Convenção Estadual do pastor Túlio Barros? Imagino que só "Assembleia de Deus do São Cristóvão" não seja o nome completo. Quem souber, por favor, me responda.

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