A escrita da história assembleiana: algumas reflexões

Nos últimos anos a Assembleia de Deus, ou os responsáveis por escrever sua história tem procurado, através da Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), servir o grande número de fieis dessa denominação, com livros históricos, nos quais a saga dos pioneiros pentecostais é revalorizada.

Nada mais natural, pois na medida em que se aproxima o centenário das Assembleias de Deus, o interesse pela história da denominação aumenta. A institucionalização da igreja e o "aburguesamento" dos membros e ministério da AD também contribui para isso. Como afirmou o sociólogo Paul Freston quando há um processo de ascensão social por parte da denominação, e ela passa a ser uma "igreja erudita", a preocupação com o controle de sua história aumenta.

Alguns livros lançados pela CPAD nos últimos anos, tem sido de grande contribuição para estudiosos e pesquisadores do movimento pentecostal. É óbvio que por se tratar de uma "história oficial", as obras editadas pela CPAD, devem ser lidas com certo espírito crítico, pois nesses livros se encontram os fatos que líderes da denominação no presente momento autorizaram a ser divulgado. Com toda certeza, muitos outros fatos históricos (ou versões) ficaram de fora, e o leitor terá tão somente uma visão parcial dos acontecimentos.

Mas algumas considerações devem ser feitas sobre a atual historiografia assembleiana.

Os livros históricos da CPAD procuram realmente informar melhor o seu público sobre a história assembleiana, trazer conhecimentos relevantes da denominação, ou será que simplesmente a editora esta procurando trazer à tona conhecimentos já divulgados por teses e estudos de historiadores e sociólogos não comprometidos com o status quo da denominação?

É impressionante a similaridade de informações que se encontram nas obras da CPAD com as de outros trabalhos já anteriormente publicados. O pior é que um desses livros, é na verdade em grande parte, uma compilação de vários outros livros já editados e estão reunidos nessa obra. Evidente que lá ao final dos textos estão as fontes, mas se o leitor acompanhar atentamente, verificará que em vez de se parafrasear, ou sintetizar com suas próprias palavras os textos, o autor (ou compilador) coloca na íntegra textos e capítulos inteiros de outros obras. Quem já escreveu um simples artigo acadêmico, conhece as regras básicas da escrita que deve vir à publico. Será que isso é ignorado na referida editora?

Seriam também os livros da Casa Publicadora uma resposta ao que os estudiosos do movimento pentecostal já estão popularizando entre os interessados no assunto? Não deveria a CPAD e seus "historiadores" estar na vanguarda da história pentecostal, ao invés de sempre publicar obras com informações já divulgadas por estudiosos das ciências sociais? Dá uma certa impressão que a editora está como se diz "correndo atrás".

Outro fator é a falta de historiadores escrevendo a história das Assembleias de Deus. O que se observa é que um grupo de jornalistas, funcionários da editora, é que tem recolhido, selecionado e escrito sobre a AD. Não que um jornalista não possa fazer história, mas é preocupante que todo o material recolhido esteja a serviço de um pequeno grupo. A denominação precisa ter seus próprios historiadores, com domínio de conceitos históricos e que façam a produção de obras mais contextualizadas. História, não é só informar, não é só curiosidade, mas é contextualizar, problematizar, levar a outras indagações e pesquisas, as quais resultem em mais conhecimentos e problemáticas.

Outra coisa preocupante, é a disponibilidade do acervo da CPAD. Percebe-se que a editora convoca seus membros a contribuírem para seu memorial com fotos e documentos, mas o mesmo não ficará disponível para os mesmos. Recentemente um de seus jornalistas "historiadores" ao ser indagado por este que vos escreve, sobre a disponibilidade do acervo, e sobre sua socialização para pesquisadores que estão fora da cidade do Rio de Janeiro, disse que não há condições de se digitalizar os documentos, pois não há funcionários e recursos suficientes para isso.

Isso quer dizer que todo material ou documento histórico enviado a editora será recolhido, e não poderá ser divulgado. Ora se todos são chamados para conceder material histórico, todos devem ter o mais rapidamente acesso a esse mesmo material. Lógico que a CPAD deve ter sua equipe, e sempre haverá um grupo seleto para escrever a "história oficial" da denominação, sempre do ponto de vista de quem esta no comando. Mas é necessário se rever alguns conceitos, caso contrário a Casa Publicadora corre o risco de sempre estar "correndo atrás", ou seja, estar continuamente publicando informações que já estão popularizadas no meio acadêmico

Essas provocações são feitas, não com o intuito de depreciar algum livro da referida editora, mas com a intenção de suscitar um debate sobre a escrita da história assembleiana. É preciso refletir sobre a produção histórica feita pelos seus responsáveis e a qualidade historiográfica de seus livros.

Comentários

  1. A paz do Senhor, irmão Mario Sérgio.

    Que Deus continue abençoando o seu blog- é muito bom mesmo. E que Deus tenha misericórdia da Assembleia; pois pelo visto, estamos com falta não somente de pastores e líderes fieis a Deus, e sim, também, de historiadores compromissados com o Senhor e com o povo.

    Um abraço.

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  2. Obrigado por sua visita e comentário irmão Nilton. Procuro simplesmente observar algumas coisas na nossa (ou na escrita) história, que talvez muitos outros já tenham observado. Sempre será uma alegria receber sua visita nesse blog.

    Abraços!

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